Timbre

Governo do Estado do Rio de Janeiro

Secretaria de Estado da Casa Civil

Assessoria Jurídica

PARECER Nº

06/2021/SECC/SUBJUR - JRMS

PROCESSO Nº

SEI-080002/000118/2021

 

 

CONSULTA SOBRE A LEGALIDADE DAS DESPESAS COM CAMPANHA PUBLICITÁRIA. ART. 37, §1°, DA CRFB/88. DIRETRIZES DA POLÍTICA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL PREVISTAS NO DECRETO N°. 46.550/19. ADESÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO AO REGIME DE RECUPERAÇÃO FISCAL. ART. 8°, INCISO X, LC Nº 159/2017. CONCEITOS JURÍDICOS INDETERMINADOS A SEREM APLICADOS PELO GESTOR PÚBLICO. ASPECTOS FORMAIS. DESCENTRALIZAÇÃO ORÇAMENTÁRIA. DECRETO Nº 42.436/10. CONTENÇÃO DE DESPESAS DURANTE O PERÍODO DE CALAMIDADE PÚBLICA. DECRETO Nº 46.993/20. VIABILIDADE JURÍDICA CONDICIONADA.

 

  

Sr. Assessor Jurídico Especial da Casa Civil,

 

I - RELATÓRIO

 

Trata-se de processo administrativo inaugurado em razão da Correspondência Interna CI SES/ASSCDE SEI Nº 01/2021 (indexador nº 12875346), da Secretaria de Estado de Saúde, por meio da qual solicita à Gabinete do Secretário autorização para iniciar e dar andamento a “CAMPANHA DE VACINAÇÃO CONTRA A COVID-19”, consignando que:

A campanha tem como objetivo minimizar os impactos da pandemia do novo coronavírus e interromper a cadeia de transmissão da Covid-19, divulgando para a população do Estado do Rio de Janeiro (de todas as faixas etárias) a importância das vacinas para a saúde pública e para a retomada das atividades econômicas, educacionais e sociais.

 

A ficha descritiva da campanha foi juntada no indexador nº 12875569.

 

A autorização foi concedida pelo i. Secretário de Estado de Saúde no indexador nº 12954521.

 

Em seguida há manifestação da Superintendente de Publicidade da Subsecretaria de Comunicação Social desta Pasta (indexador nº 13186397), destacando que “o presente processo trata de ‘CAMPANHA DE VACINAÇÃO CONTRA A COVID-19’, de ‘saúde’ e notória ‘utilidade pública’, no sentido de que a presente campanha, se enquadra ainda expressamente, nas exceções do inciso X do artigo 8° da LC n°. 159/07 com a alteração trazida pela LC nº 178/2021, por tratar de tema de saúde pública.”

 

Sendo assim, a i. Superintendente consignou o seu atesto de que “a presente campanha se enquadra nas exceções do inciso X do artigo 8° da LC n°. 159/07 com a alteração trazida pela LC nº 178/2021, por tratar de tema de saúde pública potencializada ainda pelo caráter de utilidade pública, ressaltando a importância da VACINAÇÃO CONTRA A COVID-19, conforme a ficha descritiva (indexador 12875569).”

 

Com a juntada da campanha a ser divulgada (doc. SEI 13198068), o processo foi encaminhado para a Gestora do Contrato, que assim se manifestou (indexador nº 13312777):

 

Em prosseguimento, ressaltamos que a campanha em tela, a ser executada por esta Superintendência de Publicidade da Subsecretaria Geral da SECC, se dará com recursos descentralizados da Secretaria Estadual de Saúde, de acordo com o Decreto Estadual nº. 42.436/2010, estando dentro dos limites legais estabelecidos e que fundamentam a caracterização de saúde potencializada pelo caráter de utilidade pública, razão pela qual se enquadra na execução legal prevista no inciso X, do art. 8º, da LC nº 159/2017 e suas alterações de forma complementar a LC nº 178/2021, conforme inclusive a manifestação da Superintendente de Publicidade (doc. SEI nº. 13186397).

(...)

No que tange à escolha da Agência Contratada pelo Estado para a execução desta campanha, a mesma deverá ocorrer de acordo com o disposto no Procedimento de Seleção Interna entre as Agências de Publicidade e Propaganda, item 1; "a", em conformidade com artigo 2º, § 4º, da Lei 12.232/2010, previsto no Anexo X, do Edital de Concorrência Pública n º 01/ CC/ SSCS/2015.

(...)

Sobre o a seleção interna das contratadas e com o intuito de robustecer o presente universo processual, com base no princípio administrativo da fundamentação dos atos administrativos, e ainda aos princípios da razoabilidade e da eficiência, foram anexados os documentos pertinentes (indexador SEI-13316008 - Edital, 13316112 - Procedimento de Seleção Interna e 13316449 - Contrato).

 

Insta salientar, que tendo em vista a pandemia mundial ocasionada pelo Covid-19, somada a necessidade de imunização da sociedade, a presente campanha para alcançar a finalidade do interesse coletivo, em caráter de urgência conta com a conjunção de forças entre a Secretaria de Estado de Saúde e a Secretaria de Estado da Casa Civil, a ser executada pela agência contratada devidamente selecionada, através do processo E-12/002/3246/2014, onde neste sentido instaurou-se seleção interna com a respectiva comunicação nos termos do item 2 se segs. do Procedimento de Seleção interna – Anexo X do Edital, contando com a resposta das contratadas.

 

Diante disso o aporte financeiro para financiar esta fase da campanha almejada será de R$ 13.000.000,00 (treze milhões de reais).

 

Assim, sendo o investimento superior a R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais) todas as cinco agências foram convocadas a participar da escolha da agência, atendendo ao Manual de Seleção Interna, item 2 e seguintes. Contudo, foi realizada sessão pública (doc SEI nº. 13363652) onde as quatro empresas (Agência 3, Agência Nacional, Agência Binder e Agência Artplan), comunicaram que não possuíam interesse em participar da tal seleção, conforme e-mail apresentados (doc. SEI nº 133629781336309813363209 e 13363325), sagrando como remanescente a agência Propeg que acudiu a realização da presente campanha (doc. SEI nº 13363419).

 

Por fim, a gestora consignou que “atestamos a adequação legal da presente campanha, inclusive no que tange ao artigo 37 § 1º. da Constituição Federal”, informando que “encontra-se devidamente justificada a escolha da Agência Propeg”.

 

Também foram acostados aos autos (i) Edital de licitação nº 01/2015, para contratação de serviços de publicidade (indexador nº 13316008); (ii) Anexo X, acerca do procedimento de seleção interna entre as contratadas – critério de seleção interna do art. 2§4º da Lei nº 12.232/10 (indexador º 13316112); (iii) Contrato nº 06/CC/SSCS/2016, relativo à contratação da prestação de serviços de publicidade pela PROPEG Comunicação S.A. (indexador nº 13316449); (iv) negativas de participação na concorrência para escolha da campanha de vacinação pelas empresas Artplan, Agência 3, Binder, Nacional, todas em razão do curto prazo estabelecido pela Administração Estadual (indexadores nºs 13362978, 13363098, 13363209 e 13363209); (v) aceite de participação da empresa Propeg, tendo em vista que a empresa “já estava trabalhando em uma campanha sobre este tema para apresentar ao governo, sendo assim, conseguiremos atender o prazo estabelecido” (indexador nº 13363419); e (vi) ata de sessão pública para recebimento de propostas de campanha publicitária, sendo identificada como satisfatória e única proposta apresentada (indexador nº 13363652).

 

Ato contínuo, a Subsecretaria de Administração desta Pasta remeteu o feito a esta d. Assessoria Jurídica rogando que “proceda na análise e manifestação jurídica acerca da possibilidade legal da realização da pretendida campanha” (indexador nº 13368664).

 

É o relatório. Passa-se, pois, à análise jurídica.

 

 

II – ANÁLISE JURÍDICA

 

Preliminarmente, é indispensável o esclarecimento de que não serão avaliados, nesta manifestação, aspectos de ordem estritamente técnica ou econômica inerentes à matéria posta. Afirma-se isso porque esta Assessoria Jurídica não possui a expertise necessária, tampouco seria sua atribuição, avaliar o mérito das análises de ordem técnica e financeira empreendidas nos autos.

 

A presente manifestação, assim, limita-se à análise de viabilidade jurídica de realização da campanha publicitária à luz das vedações constantes da Lei Complementar nº 159/2017, nos exatos termos da consulta formulada a esta Assessoria Jurídica.

 

Vale pontuar que, no que se refere à escolha da Agência de Publicidade que será responsável pela elaboração da campanha, muito embora a justificativa apresentada no indexador nº 13312777 tenha sido no sentido de que apenas uma empresa afirmou o interesse em participar do procedimento de seleção delineado no indexador nº 13316112, conforme consta na Ata de Sessão Pública do indexador nº 13363652, depreende-se das manifestações de declínio das demais empresas que todas ocorreram pelo mesmo motivo: o exíguo prazo para desenvolvimento da campanha (indexadores nºs: 13362978, 13363098, 13363209 e 13363209).

 

Ocorre que, no indexador nº 13363419, foi expressamente consignado pela única Agência de Publicidade que apresentou proposta de campanha publicitária, que isso seria possível porque “a Propeg já estava trabalhando em uma campanha sobre este tema para apresentar ao governo, sendo assim, conseguiremos atender o prazo estabelecido.”

 

Desta feita, compete a esta Assessoria Jurídica orientar o gestor para que se certifique se a Propeg foi, de alguma forma, beneficiada por ter, eventualmente, conhecimento anterior às demais empresas da campanha que seria contratada pela Administração Estadual, com eventual reabertura de prazo compatível para formulação e apresentação de propostas de campanhas publicitárias por outras agências.

 

Aqui, releva destacar que todo e qualquer procedimento e/ou contratação realizados pelo Poder Público deve observar os princípios consagrados no art. 37 da Constituição Federal, em especial a moralidade administrativa e os corolários da publicidade e transparência dos atos administrativos.

 

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)   

 

Feitos esses breves comentários, cumpre prosseguir.

 

 

II.1. DAS DIRETRIZES DA POLÍTICA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL PREVISTAS NO DECRETO N° 46.550/19 E DAS ATRIBUIÇÕES DA SSCS.

 

O Decreto n° 46.550, de 01 de janeiro de 2019, com as alterações promovidas pelo Decreto n°46.764/19, estabelece as diretrizes da Política de Comunicação Social e normas para a licitação, contratação e execução de serviços de comunicação no âmbito da Administração Pública estadual, dispondo em seu artigo 2º que:

 

Art. 2º - As ações de comunicação social compreendem as áreas de:

I - imprensa;

II - relações públicas;

III - comunicação digital (sítios eletrônicos, portais, mídias sociais digitais, app`s, banner`s);

IV - publicidade, que abrange:

a) a propaganda de utilidade pública, institucional e mercadológica;

b) a publicidade legal;

c) a promoção institucional e mercadológica, incluídos os patrocínios.

V - participação, organização e/ou realização de eventos.

VI - Promoção de Políticas Públicas, incluída a promoção turística do Estado do Rio de Janeiro no Brasil e no Exterior;

Parágrafo único - A publicidade que tiver por objetivo a divulgação de política pública de fomento, desenvolvimento e promoção do turismo do Estado do Rio de Janeiro será considerada de utilidade pública.

 

O conceito dessas espécies de propaganda, contudo, são encontrados na Resolução Casa Civil/RJ n° 35, de 29 de junho de 2018[1], que, ao tratar da suspensão da publicidade de órgãos e entidades no período eleitoral, distinguiu a publicidade institucional da publicidade de utilidade pública, conceituando-as na forma abaixo:

 

Art. 4º - Para os efeitos desta Resolução, consideram-se:

(...)

II - Publicidade de Utilidade Pública: a que se destina a divulgar direitos, produtos e serviços colocados à disposição dos cidadãos, com o objetivo de informar, educar, orientar, mobilizar, prevenir ou alertar a população para adotar comportamentos que lhe tragam benefícios individuais ou coletivos e que melhorem a sua qualidade de vida;

III - Publicidade Institucional: a que se destina a divulgar atos, ações, programas, obras, serviços, campanhas, metas e resultados dos órgãos e entidades do Poder Executivo Estadual, com o objetivo de atender ao princípio da publicidade, de valorizar e fortalecer as instituições públicas, de estimular a participação da sociedade no debate, no controle o na formulação de políticas públicas e de promover o Brasil no exterior.

 

Ademais, o Decreto n° 46.550/19, especialmente nos seus artigos 4º a 8º, atribui à Subsecretaria de Comunicação Social da Secretaria de Estado de Casa Civil e Governança a competência administrativa privativa para celebração, gestão e fiscalização dos contratos de publicidade no âmbito da Administração Direta e Indireta. Confira-se:

 

Art. 4º - Incumbe privativamente à Subsecretaria de Comunicação Social da Secretaria de Estado de Casa Civil e Governança:

I - promover licitação, por valor global estimativo, para contratação de serviços de publicidade e propaganda da Administração Direta e Indireta, a serem prestados por uma ou mais agências especializadas;

II - promover licitação, por valor global estimativo, para contratação dos serviços de comunicação nas áreas de consultoria, análise editorial e de riscos de imagem, planejamento estratégico e assessoria de comunicação da Administração Direta, a serem prestados por uma ou mais agências especializadas;

III - promover licitação, por valor global estimativo, para contratação de serviços de organização e realização de eventos da Administração Direta e Indireta, de qualquer natureza, a serem prestados por uma ou mais empresas especializadas;

IV - a celebração e a gestão dos contratos com as agências e empresas vencedoras dos certames aludidos nos incisos anteriores.

 

Art. 5º - Ficam concentradas na Subsecretaria de Comunicação Social da Secretaria de Estado de Casa Civil e Governança a gestão e a execução dos contratos a que se refere o art. 4°e, em especial, a solicitação de serviços às empresas contratadas, a fiscalização dos contratos e a avaliação dos respectivos resultados.

Parágrafo Único - O pagamento das despesas, a que se refere o caput, poderá ser feito à conta da rubrica orçamentária própria da Subsecretaria de Comunicação Social da Secretaria de Estado de Casa Civil e Governança ou por descentralização da execução do crédito orçamentário, mediante ato regulamentar específico e conjunto, oportunamente celebrado com o órgão da Administração Direta ou entidade da Administração Indireta.

 

Art. 6º - Todos os serviços de comunicação de interesse dos órgãos da Administração Direta ou entidades da Administração Indireta, previstos neste Decreto, deverão ser submetidos à prévia aprovação da Subsecretaria de Comunicação Social da Secretaria de Estado de Casa Civil e Governança, que verificará a sua compatibilidade com as diretrizes da política estadual de comunicação social, sendo vedada qualquer ação, sem a prévia e competente autorização.

 

Art. 7º - A Subsecretaria de Comunicação Social da Secretaria de Estado de Casa Civil e Governança deverá avaliar a qualidade técnica dos serviços prestados, o resultado das ações, bem como deverá, sendo o caso, apresentar sugestões aos demais órgãos ou veículos de divulgação oficial.

 

Art. 8º - Caberá à Subsecretaria de Comunicação Social da Secretaria de Estado de Casa Civil e Governança:

I - coordenar o desenvolvimento e a execução das ações de comunicação  os órgãos da Administração Direta e entidades da Administração Indireta quando exijam esforço integrado de comunicação;

II - supervisionar o conteúdo de comunicação das ações de publicidade e as de patrocínio, em consonância com suas políticas, diretrizes e  orientações específicas;

III - controlar, nas ações de comunicação, a observância dos objetivos e das diretrizes da política de comunicação, no tocante ao conteúdo e aos aspectos técnicos;

IV - editar políticas, diretrizes, orientações e normas complementares deste Decreto;

V - planejar, desenvolver e executar as ações de comunicação das áreas discriminadas no art. 2º e outras subsidiárias ou complementares a elas, realizadas com recursos orçamentários próprios ou descentralizados, com observância da eficiência e racionalidade na sua aplicação;

VI - coordenar negociações de parâmetros para compra de tempos e espaços publicitários de mídia pelos órgãos e entidades da Administração Pública Estadual;

VII - definir a adoção de critérios de utilização de marcas para ações de publicidade e de

patrocínio e a identidade visual do Governo nos sítios eletrônicos e portais dos órgãos e entidades da Administração Pública Estadual na internet;

VIII - definir diretrizes para a comunicação digital nos sítios eletrônicos e portais dos órgãos e entidades da Administração Pública Federal;

IX - apoiar os órgãos e as entidades nas ações de imprensa que exijam, pela natureza da pauta, articulação interna e participação coordenada, no âmbito da Administração Pública Estadual;

X - coordenar as ações de assessoria de imprensa dos órgãos e das entidades da Administração Pública Estadual, sobretudo aqueles que exijam esforço integrado de comunicação;

XI - realizar ações de aperfeiçoamento em comunicação para servidores públicos;

XII - licitar, contratar e executar os serviços de que trata, especialmente, o art. 4º deste Decreto.

 

Como consequência, os demais órgãos da Administração Direta e as entidades integrantes da Administração Indireta terão que utilizar os contratos celebrados pelo Estado do Rio de Janeiro com as sociedades prestadoras de serviços de publicidade e propaganda, por intermédio da Subsecretaria de Comunicação Social desta Secretaria, para tanto efetuando o pagamento dos serviços a serem prestados por descentralização da execução do crédito orçamentário, procedimento regulamentado pelo Decreto nº 42.436/2010.

 

 

II.2. LEI COMPLEMENTAR Nº 159/2017: REGIME DE RECUPERAÇÃO FISCAL. ARTIGO 37, § 1º, DA CF/88. LIMITES CONSTITUCIONAIS E LEGAIS À PUBLICIDADE GOVERNAMENTAL.

 

A Constituição Federal autoriza a publicidade governamental que tenha cunho educativo, informativo ou de orientação social (artigo 37, § 1º, da CF/88) como forma de prestação de contas e de informação sobre as atividades administrativas dirigidas à população, nos seguintes termos:

 

Art. 37. (...)

§ 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.

 

Assim, a partir da referida norma constitucional, e na linha de pronunciamentos anteriores do Conselho de Supervisão de Regime de Recuperação Fiscal[2] e da d. PGE[3], é possível concluir desde logo que a constitucionalidade da publicidade governamental pressupõe que o conteúdo das ações publicitárias ou de propaganda (1) tenha caráter educativo, informativo ou de orientação social; (2) não contenha nomes, símbolos, mensagens ou imagens que, ainda que subliminarmente, caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos; e que (3) não veicule mensagem genérica sobre atos, ações, projetos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos ou entidades públicas, suas metas ou resultados.

 

Ainda, conforme se depreende do entendimento do CSRRF, não basta a mera alegação de que determinada despesa se inclui entre as exceções previstas na legislação, sendo necessário que ela ostente as características acima mencionadas.[4]

 

Além de respeitar as referidas diretrizes constitucionais, atualmente qualquer ação publicitária na esfera da Administração Pública deve estar de acordo com a Lei Complementar n° 159, de 19 de maio de 2017, que instituiu o Regime de Recuperação Fiscal dos Estados e Distrito Federal, ao qual o Estado do Rio de Janeiro aderiu expressamente mediante acordo de recuperação fiscal homologado em 06 de setembro de 2017.

 

O Regime de Recuperação Fiscal, como se sabe, impõe uma série de restrições aos entes aderentes, reduzindo o seu âmbito de discricionariedade no dispêndio de receita pública. No que importa para a presente análise, cumpre destacar que, durante a vigência do Plano de Recuperação Fiscal, é vedada, como regra geral, a realização de empenho ou a contratação de despesas com publicidade e propaganda, exceto para as áreas de saúde, segurança, educação no trânsito e outras de demonstrada utilidade pública, consoante o disposto no artigo 8º, inciso X, da LC 159/17, in verbis:

 

Art. 8º São vedados ao Estado durante a vigência do Regime de Recuperação Fiscal: (...)

X - o empenho ou a contratação de despesas com publicidade e propaganda, exceto para as áreas de saúde, segurança, educação no trânsito e outras de demonstrada utilidade pública;

 

A adesão ao regime de recuperação fiscal é facultativa, como deflui óbvio da leitura do artigo 4º do referido diploma. Contudo, uma vez que o ente federativo adira aos seus termos, não lhe é dado definir o regime jurídico ao qual se submeter.

 

Deste modo, para que não haja violação ao Regime de Recuperação Fiscal, as despesas com publicidade e propaganda devem se enquadrar em uma das exceções previstas no artigo 8º, inciso X, parte final, da lei, isto é, estarem relacionadas às áreas de saúde, segurança, educação no trânsito ou outra área de demonstrada utilidade pública.

 

Trata-se de rol exemplificativo de exceções, tendo a Lei Complementar admitido que outras situações sejam enquadradas nas hipóteses em que se permite a realização de empenho ou a contratação de despesas com publicidade e propaganda, desde que o Administrador demonstre a utilidade pública dessas ações.

 

De todo modo, observa-se que o artigo acima transcrito faz uso de conceitos jurídicos indeterminados, os quais possuem zonas de certeza positiva, negativa e “zonas cinzentas”.

 

Nesse contexto, não compete a esta Assessoria Jurídica firmar entendimento acerca do conteúdo editorial da campanha publicitária que se pretende realizar. Também a esta ASJUR o enquadramento da campanha como publicidade de saúde, caso em que seria pertinente a análise da Lei Complementar nº 141/2012, ou se a mesma se revelaria de utilidade pública.

 

De fato, compete ao administrador o referido enquadramento, com a valoração e aplicação do conceito indeterminado de “utilidade pública” diante das especificidades de cada caso concreto[5], pautando a escolha do modo como o órgão executará as ações de comunicação social e alcançará os objetivos estabelecidos no Decreto n° 46.550/19 com as alterações promovidas pelo Decreto n°46.764/19[6].

 

É dizer: a aferição da natureza dos serviços de publicidade dependerá das circunstâncias de cada caso concreto, motivo pelo qual a análise do material a ser veiculado nas campanhas publicitárias deve ser feita de forma casuística pela Subsecretaria de Comunicação Social desta Casa Civil e Governança, de modo a se garantir a divulgação de conteúdos que se mostrem compatíveis com a Constituição Federal, com as diretrizes da Política de Comunicação Social contidas no Decreto estadual n° 46.550/19 e com a Lei Complementar n° 159/17.

 

 

II.3. DECRETO ESTADUAL Nº 46.993, DE 25 DE MARÇO DE 2020: CONTENÇÃO DE DESPESAS DURANTE O PERÍODO DE CALAMIDADE PÚBLICA.

 

Diante da pandemia causada pelo novo Coronavirus (COVID-19) que assola o mundo, o Estado do Rio de Janeiro, dentre outras medidas, editou o Decreto estadual nº. 46.993/2020, que dispõe sobre a contenção de despesas durante o período de calamidade pública e dá outras providências.

 

O Decreto em referência suspendeu a realização de novas despesas de caráter não essencial no âmbito do Poder Executivo, elencando em seu anexo, dentre as despesas consideradas não essenciais, aquelas com publicidade e propaganda.

 

No entanto, importa anotar que o próprio Decreto estadual n°. 46.993, de 25 de março de 2020, no §1º do seu artigo 2º, excepciona das restrições impostas “as Unidades Orçamentárias que atuem diretamente no enfrentamento à Pandemia provocada pelo alastramento do COVID-19”, especialmente as elencadas a seguir:

 

I - Secretaria de Estado de Saúde;

II - Fundo Estadual de Saúde;

III - Fundação Saúde do Estado do Rio de Janeiro;

IV - Instituto Vital Brazil; V - Instituto de Assistência aos Servidores do Estado do Rio de Janeiro;

VI - Secretaria de Estado de Polícia Militar;

VII – FUNESPOM;

VIII - Secretaria de Estado de Polícia Civil

IX - FUNESPOL

X - Secretaria de Estado de Defesa Civil;

XI - Fundo Especial do Corpo de Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro;

XII - Secretaria de Estado de Governo, nas ações orçamentárias referentes à Operação Segurança Presente.

 

Dessa forma, tendo em vista que a campanha de vacinação contra a COVID-19 foi solicitada pela Secretaria de Estado de Saúde e será custeada com recursos descentralizados daquela Pasta, não se vê óbice no Decreto n°. 46.993/20 para a sua execução, devendo, no entanto, o Administrador observar todas as demais recomendações traçadas ao longo deste pronunciamento.

 

 

II.4. DESCENTRALIZAÇÃO ORÇAMENTÁRIA.

 

Conforme já mencionado, a consulta jurídica refere-se à viabilidade jurídica de realização da campanha publicitária pretendida, de modo que não serão analisados aspectos atinentes à descentralização orçamentária para fazer frente aos custos da campanha pretendida.

 

Contudo, a fim de prestigiar a celeridade e a eficiência administrativa, serão feitos abaixo breves comentários sobre o tema, não exaurindo a análise do ponto no presente feito.

 

Com efeito, a descentralização de créditos orçamentários é a figura pela qual uma unidade orçamentária ou administrativa transfere à outra o poder de utilizar créditos que lhes foram consignados na lei orçamentária anual, para realização de ação de governo pactuada, respeitada fielmente a classificação funcional programática.

 

No âmbito do Poder Executivo estadual, o instituto foi regulamentado pelo Decreto estadual nº 42.436, de 30 de abril de 2010, que determina que “a cooperação entre órgãos e entidades integrantes do Orçamento do Estado do Rio de Janeiro, visando à consecução de um objetivo que resulte no aprimoramento da ação de governo, processar-se-á prioritariamente por meio da descentralização da execução de crédito orçamentário” (art. 1º).

 

O ato normativo, em seu art. 2º, indica as formas de execução orçamentária e financeira descentralizada, determinando que a mesma poderá se dar de duas formas, elencadas em seus incisos.[8] Assim, no presente processo, a ação se classifica como “descentralização externa”, eis que feita entre duas Secretarias.

 

O art. 5º do referido Decreto estipula que “a execução descentralizada dos créditos orçamentários observará obrigatória e integralmente a consecução do objeto previsto no Programa de Trabalho consignado no orçamento, respeitada fielmente a classificação funcional, por fonte de recursos e por natureza de despesa.”

 

Nesses termos, o dispositivo supratranscrito sujeita a execução descentralizada dos créditos orçamentários à consecução do objeto previsto no Programa de Trabalho.

 

Especificamente no tocante à formatação jurídica para a proposta em tela, o art. 7º do mesmo diploma afirma que “a descentralização externa deverá ser efetuada por Portaria ou Resolução Conjunta, firmada pelos titulares dos órgãos e/ou entidades concedente(s) e executante(s), originando em Destaque de Crédito e sendo registrado por meio de Nota de Movimentação de Crédito”.

 

Ainda, o referido dispositivo, em seu §2º, indica a utilização do modelo de Portaria/Resolução constante no Anexo do normativo e estabelece os requisitos a serem preenchidos.

 

Portanto, para a futura execução da descentralização orçamentária, deve-se observar as diretrizes acima apontadas, bem como o procedimento estabelecido pelo art. 4° do Decreto estadual nº 31.896/2002. [9]

 

 

III - CONCLUSÃO

 

Ante o exposto, tem-se que a realização de despesa de publicidade relacionada à saúde, segurança, educação no trânsito ou outra matéria de utilidade pública, durante a vigência do Regime de Recuperação Fiscal, é possível, na esteira das exceções previstas no art. 8º, X, da Lei Complementar nº 159/2017.

 

Em resposta à consulta formulada, portanto, conclui-se que, à luz da LC no 159/2017, é permitida a realização de despesas com publicidade, na esteira do seu art. 8º, X, desde que:

 

(i) Tenha caráter educativo, informativo ou de orientação social, conforme exigido pelo art. 37, §1º, da CF;

(ii) Não contenha nomes, símbolos, mensagens ou imagens que, ainda que subliminarmente, caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos, conforme exigido pelo art. 37, §1º, da CF;

(iii) Não veicule mensagem genérica sobre atos, ações, projetos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos ou entidades públicas, suas metas ou resultados (Pareceres SEI Nº 1358/2019/ME e SEI Nº 1630/2019/ME, exarados pelo CSRRF);

(iv) Observe a necessidade de autorização veiculada no Decreto nº 46.993/20, que dispõe sobre a contenção de despesas não essenciais durante o período de calamidade pública gerado pelo COVID-19, considerando as alterações promovidas pelo Decreto estadual nº 47.163/2020.

 

É o parecer. À consideração superior.

 

 

Rio de Janeiro, 10 de fevereiro de 2020.

 

 

JULIA ROMÉRO MAGALHÃES SOARES

Assessora Jurídica da ASJUR/SECC

ID Funcional nº 5103838-2

 

[1] A resolução em questão trata da matéria de forma idêntica à Resolução Casa Civil/RJ n. 345/2014, que a precedeu, e que é citada pelo CSRRF em suas manifestações.

[2] Parecer SEI n°. 1358/2019/ME.

[3] Visto do Procurador-Geral do Estado aprovando parcialmente o Parecer ASJUR/SETUR n°. 33-A/2019.

[4] Corroborando esse entendimento, confira-se a manifestação do Procurador do Estado Felipe de Melo Fonte, integrante do Núcleo de Monitoramento do Regime de Recuperação Fiscal da PGE-RJ, nos autos do processo administrativo no E-05/003.289/2019, instado a se manifestar sobre a matéria em razão do Parecer ASJUR/SETUR no 33-A/2019, acima mencionado: “Acerca da matéria em apreço, salientamos a existência de entendimento consolidado no âmbito do Conselho de Supervisão Fiscal no sentido de que as despesas de publicidade e propaganda realizadas para promoção do turismo do Estado se tratam de demonstrada utilidade pública e se enquadram na exceção prevista pelo inciso X do art. 8' da Lei Complementar n' 159/ 2017 desde que: (i) não contenha nomes, símbolos, mensagens ou imagens que, ainda que subliminarmente, caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos e que (ii) não seja de mensagem genérica sobre atos, ações, projetos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos ou entidades públicas, suas metas ou resultados, conforme PARECER SEI Nº 1358/2019/ME, ora anexado aos autos”.

[5] Neste mesmo sentido, a respeito do manejo de conceito jurídico indeterminados, veja-se a posição da PGE refletida no Enunciado PGE n° 20: “1. A emergência, a ensejar dispensa de licitação, é um conceito jurídico indeterminado a ser valorado pelo administrador diante das especificidades do caso concreto, observados, em especial, os princípios da razoabilidade, moralidade e eficiência. (...)”

[6] Art. 1º - A comunicação social do Poder Executivo do Estado do Rio de Janeiro será executada de acordo com o disposto neste Decreto e terá como objetivos principais:

I- disseminar informações sobre assuntos de interesse dos mais diferentes segmentos sociais;

II - estimular a sociedade a participar do debate e da definição de políticas públicas essenciais para o desenvolvimento do Estado;

III - realizar ampla difusão dos direitos do cidadão e dos serviços colocados à sua disposição;

IV - explicar os projetos e políticas de governo propostos pelo Executivo Estadual nas principais áreas de interesse da sociedade;

V- estimular e promover o crescimento econômico e social do Estado do Rio de Janeiro;

VI - atender às necessidades de informação de clientes, usuários e destinatários das entidades da Administração Indireta e das empresas sob controle direto e indireto do Estado do Rio de Janeiro;

VII - viabilizar e efetivar políticas públicas; e

VIII - promover o Estado do Rio de Janeiro no Brasil e no exterior.”

 

[8] Art. 2º - A execução orçamentária e financeira da despesa poderá se dar de forma descentralizada.

I – entre Unidades Gestoras pertencentes à estrutura administrativa de um mesmo órgão ou entidade, designa-se este procedimento de descentralização interna e;

II – entre Unidades Gestora de órgãos ou entidades de estruturas diferentes, da Administração Direta e Indireta, designa-se este procedimento de descentralização externa.

[9] Art. 4º - Incumbe aos Secretários de Estado e aos titulares dos demais órgãos diretamente subordinados ao Governador do Estado, observadas as suas respectivas competências, oferecer a exame final do Gabinete Civil proposta para a elaboração de atos normativos ou regulamentares que considerem necessário editar, referidos nos arts. 110, I, II, III e IV, 145, IV e VI, 148, II, e 211, §3º, da Constituição do Estado, à qual constituirá processo proponente em que serão anexados obrigatoriamente:

I – a exposição de motivos, as notas explicativas e as justificativas para a edição do ato;

II – o projeto do ato normativo;

III – o parecer conclusivo do órgão de assessoramento jurídico da respectiva Secretaria de Estado, quanto à constitucionalidade e à juridicidade da proposição, bem como sobre a forma do ato a ser editado.


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Documento assinado eletronicamente por Julia Romero Magalhães, Assessora, em 10/02/2021, às 20:14, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento nos art. 21º e 22º do Decreto nº 46.730, de 9 de agosto de 2019.


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Referência: Processo nº SEI-080002/000118/2021 SEI nº 13428183